Avenida Adriano Correia de Oliveira: O símbolo da canção de intervenção
A avenida do Montijo evoca uma figura idolatrada por uma geração que se muniu da música como arma contra o regime salazarista.
Adriano Maria Correia Gomes de Oliveira nasceu na cidade do Porto a 9 de abril de 1942. Filho de Joaquim Gomes de Oliveira (conhecido por Joaquim Trafegueiro) e de Laura Correia foi com apenas alguns meses de vida que passou a morar na margem esquerda do rio, na Vila de Avintes. Conhecida por ser a “terra de agricultores e pescadores”, o ambiente tipicamente rural marcou a infância e juventude do músico.
Manuel Reis, no seu livro “Adriano Presente!” revela mesmo os desabafos do cantor sobre a sua terra: “Este é o sítio mais bonito do mundo”, dizia. Nunca se prendia de levar todos os amigos para sua casa e, segundo Roberto Machado, chegavam a juntar-se mais de 30 pessoas num ambiente de convívio. A sua generosidade e hospitalidade eram apreciadas por todos.
Em 1959 ingressou no Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, numa época de agitação social que instigava aos impulsos e à mudança. O próprio fado passava por um momento de mudança com o contributo de Edmundo Bettencourt, fundador da Presença e lendário compositor e intérprete da canção de Coimbra.
Nesse mesmo ano, o estudante de Direito inscreveu-se como primeiro-tenor no Orfeão Académico e juntou-se às vozes do fado em Coimbra. Envolvido num ambiente de revolução, Adriano Oliveira conheceu os problemas de uma juventude que entrava em colisão com o regime e foi bebendo desse ambiente para as suas influências musicais.
Manuel Reis conta também que “a primeira aspiração de Adriano no campo cultural foi tocar viola elétrica no conjunto ligeiro da Tuna Académica, lugar para o qual tinha já alguma experiência. No entanto, esse lugar já estava ocupado por José Niza, acabando Adriano por procurar um novo caminho para a música”.
Desde cedo que o interesse pela área cultural constituiu a sua preferência, deixando o curso de Direito para segundo plano. Na década de 60 participou também no Grupo Universitário de Danças Regionais da Associação Académica de Coimbra e no CITAC – Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra, onde representou várias peças.
O seu percurso no fado começou com Eduardo Melo quando começou a assistir aos ensaios do Grupo Eduardo Melo, do qual fazia parte Ernesto Melo, Durval Moreirinhas e Eduardo Melo. Adriano Oliveira acompanhava o grupo nas serenatas de rua e ficava encarregue de transportar a viola de Durval Moreirinhas. Num desses dias, o cantor faltou e Adriano Oliveira, conhecendo as letras, foi o seu substituto. Manuel Reis explica que o grupo ficou surpreendido com o excelente resultado da voz do músico ao ar livre, muito semelhante à de Zeca Afonso. Foi a partir desse momento de glória que conseguiu integrar o grupo.
Daí em diante, o músico de Avintes passou a compor a um ritmo frenético, tendo gravado 90 títulos entre 1960 e 1980. Tal como outros artistas em Portugal, Adriano Correia fez da música um ato de intervenção e ao gravar “Trova do Vento que Passa“, da autoria de Manuel Alegre, criou uma referência ímpar das músicas de intervenção em Portugal contra o regime fascista e um hino do movimento estudantil.
No seu livro, Manuel Reis enuncia que a música “foi cantada pela primeira vez numa festa de receção de caloiros da Faculdade de Medicina em Lisboa, realizada no Hospital de Santa Maria. A sala estava repleta e Adriano teve que repeti-la seis vezes. Mais tarde, os estudantes saíram para a rua a cantar em coro. Foi o quebrar do gelo que se tinha instalado no movimento estudantil após a repressão de 62 e 63“.
Casou em 1966 e essa “viragem na vida pessoal” viria a ser espelhada, mais tarde, na sua produção musical. Do matrimónio resultaram dois filhos, Isabel e José Manuel. Quando lhe faltava uma cadeira para terminar o curso de Direito, Adriano trocou Coimbra por Lisboa, trabalhou no Gabinete de Imprensa da Feira Industrial de Lisboa (FIL) e foi produtor da Editora Orfeu.
Na fase final da sua vida – Adriano viria a falecer a 16 de Outubro de 1982, com 40 anos, em Avintes, vítima de uma hemorragia esofágica – foi acompanhado à guitarra por Paulo Vaz de Carvalho. Louzã Henriques, seu médico e grande amigo recorda “um homem valente” que “sabia perfeitamente o que queria e por que lutava. Nasceu para ser livre e para ser artista“.
O último espetáculo do portista ocorreu em Mondim de Basto, num encontro do partido comunista que se realizou numa escola. A Avenida do Montijo evoca assim o nome de uma figura que tinha a música como arma contra o regime salazarista.