Ourivesaria Pérola: A jóia mais antiga do Montijo

Com mais de 50 anos de existência, as paredes da Ourivesaria Pérola erguem-se de muito trabalho e estórias desafiantes.

Um nome brilhante, um local de referência e um lugar conhecido por todos no Montijo. Lá dentro, Maria Caramujo está envolvida no seu trabalho, mas, ao ver a silhueta de um cliente à sua porta, levanta a cabeça para cumprimentar quem passa e prontifica-se a ajudar, como o faz há mais de 50 anos. O brilho preenche as paredes da Ourivesaria Pérola e confere-lhe o ar luxuoso com que é conhecida na cidade.

O meu marido foi ourives ambulante. Tinha uma motinha, aliás todos os ourives andavam com uma caixinha verde que os identificava. Uns andavam de bicicleta, outros de motorizada e andavam pelos campos e pelas aldeias a vender ouro de porta em porta. Toda a gente os conhecia. Entretanto, surgiu a oportunidade de ficarmos com esta casa e aceitámos. A nossa vida mudou a partir daí”, conta.

Com um espaço próprio, não era apenas o trabalho que era alvo de recomendação, mas principalmente a simpatia e a honestidade dos proprietários. “O meu marido era um homem bom que ajudava muitas pessoas. Aqui na terra era e ainda é muito conhecido. Cada vez que precisavam de alguma coisa vinham aqui falar com ele. Essa perda foi irreparável, mas o trabalho ajuda-me a ocupar um pouco a cabeça.”, expressa com sinceridade.

Desde então, a septuagenária comanda o negócio e esmera-se para perpetuar a memória do marido e, em simultâneo, continuar a fazer aquilo que a deixa feliz.

Eu adoro estar a atender ao público. Não é só da perspetiva da venda é do contacto com as pessoas. As minhas amigas vêm aqui e ficam a falar um pouquinho. Esta senhora que aqui esteve veio comprar uma pecinha, mas estivemos muito tempo à conversa. É disto que eu gosto”, explica.

Fachada da loja_DR

De aspeto delicado, Maria Caramujo revela um espírito forte ao fim de dois minutos de conversa. Por mais obstáculos que a vida lhe tenha colocado no caminho, a ideia de abandonar a sua profissão nunca lhe passou pela cabeça.

Uma vez fomos assaltados de noite. Os ladrões arrombaram a porta lateral do prédio que dava acesso ao primeiro andar. Fizeram um buraco no chão e saltaram cá para baixo. Levaram tudo o que eu tinha aqui. Não ficou nada. Foram chamar-me de manhã porque alguém deu com a porta lateral do beco aberta e despertou à atenção. (…) Nunca conseguimos reaver nada, nem se sabe quem foi. Tivemos de começar a nossa vida do zero”, conta com ar abatido.

Ao possuir “uma das casas mais antigas da cidade“, a relação com os clientes é feita de grande familiaridade e as estórias que as quatro paredes escondem são dignas de uma sala de cinema.

Há sete anos voltei a ser assaltada aqui, mas desta vez à mão armada. Ia fechar a loja para o almoço. Tinha a porta aberta e estava a fazer as contas. Quando levanto os olhos, vejo um encapuçado à porta e outro a dirigir-se para mim. Disse-me «Cala-te que é um assalto!». Fiquei a tremer. Não me fizeram mal, mas eu caí imediatamente no chão inconsciente. Tinha um homem a tapar-me a boca e outro a partir tudo.”, relata.

O ouro e a prata ocupam um espaço de destaque no negócio

Mas não só de sustos é feita a estória da Ourivesaria Pérola e é a confiança dos montijenses que motiva Maria Caramujo a mostrar o seu sorriso amoroso, todos os dias, por detrás do balcão. Confidências, lágrimas e pedidos especiais marcam o nome de um espaço que já é mais do que uma ourivesaria.

Toda a gente conhece a Ourivesaria Pérola no Montijo. As pessoas antigas, da minha idade, quando precisam de qualquer coisa são fiéis à minha casa. Aparecem aqui com uma ideia e, às vezes, sem ideia nenhuma e eu tento sempre ajudar o melhor que sei. Há sempre uma solução para qualquer problema.“, revela.

A dona da ourivesaria esboça um sorriso e, ao olhar para as suas jóias, vislumbra um passado marcado pela agitação, onde o comércio local era o melhor amigo dos fregueses.

Chegámos a ter quatro pessoas a atender ao balcão. No Natal isto era uma azáfama. Um mês antes do Natal, eu e a minha filha já começávamos a fazer lacinhos e embrulhos para as prendas. Eram caixotes e caixotes de lacinhos. Agora não vale a pena, faz-se na hora. É muito triste esta evolução, mas temos de acompanhar.“, conta.

Maria Caramujo a fazer as contas do turno da manhã

Ao pensar sobre o futuro, deixa sair um desabafo profundo. “Tenho muita pena de um dia ir para casa e deixar de ter esta atividade. Não é que não tenha idade porque já tenho 79 anos, mas não quero estar em casa. Enquanto eu puder estar ativa fico por cá”. E não é apenas Maria Caramujo que irá sentir falta dos dias de trabalho, mas todos os montijenses que encontram nesta casa uma recordação do que o Montijo outrora foi.

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