Vanessa Gingeira: “Escrever o Ciclone foi um sonho tornado realidade”
Vanessa Gingeira é ‘montijense de gema’, sempre foi apaixonada pela escrita e, em 2016, o sonho tornou-se realidade com o lançamento do livro “Ciclone”, cuja história é inspirada nas vivências das gentes da terra. Em conversa com o Montijo On City, Vanessa fala sobre o processo de publicação do primeiro livro e os “planos na manga” para um futuro que passa, sem dúvida, por continuar a escrever.
Fale-me um bocadinho de si. É do Montijo?
Sou do Montijo. Neste momento não estou a viver cá, há quatro anos que vivo em Alcochete, mas trabalho aqui e a minha vida é feita aqui. Os meus pais são montijenses de gema, como costumo dizer, nasceram e cresceram cá. Sou de uma família antiga do Montijo, o Gingeira é uma família muito conhecida.
Estudei em Évora, estive lá cinco anos e depois voltei para o Montijo. No meu primeiro casamento fui viver para a Atalaia, depois quando me divorciei vim para o Montijo e quando voltei a juntar-me fui para Alcochete. Mas esta é a minha zona, foi aqui que cresci e é aqui que me identifico.
Qual é a sua profissão?
Sou da área do ambiente. Há 20 anos quando entrei para a Câmara Municipal do Montijo fui para a área animal, sou do curso de engenharia zootécnica, fui trabalhar com os veterinários, trabalhava em segurança alimentar e bem-estar animal, estive lá quase 10 anos.
Entretanto na Casa do Ambiente foi necessário alguém substituir a coordenadora que aqui estava e vim para aqui fazer sensibilização ambiental, mas sou uma pessoa muito ativa e só isso não dava para mim. Acabei por ser chamada para outro tipo de trabalhos, neste momento tenho a sensibilização ambiental, a mobilidade do concelho, a eficiência energética …
Como surgiu a escrita no meio de tudo isso?
A escrita é uma coisa que me acompanha desde sempre. Quando era miúda, nos tempos de escola, era eu que fazia as dedicatórias quando as colegas iam embora, as músicas que se escrevia, até poemas, sempre gostei de escrever.
Comecei a escrever o “Ciclone” mais no sentido de brincadeira, precisava de me entreter com alguma coisa. Estava no terraço e a pensar que não tinha nenhum livro para ler, comecei a escrever e a gostar. Com tempo comecei a pensar em fazer uma história, mas não era com o intuito de publicar, foi aos poucos, foi crescendo aos poucos. Quando me divorciei comecei a ficar mais dirigida para o livro, senti necessidade de escrever, nesse ano dediquei-me e no ano seguinte acabei por publicar porque mandei para umas editoras e fui aceite, fiquei radiante.
Como foi o processo depois de ser aceite pela editora?
Foi muito engraçado porque tudo era novidade. A verdade é que os autores em Portugal não têm uma profissão fácil, claro que gostava de ser escritora, gostava de viver disso, mas tenho a noção que é muito difícil.
Quando pensei em publicar o livro fiz uma consulta de uma série de editoras e mandei, tive uma que aceitou logo nessa semana, fiquei eufórica. Fui às instalações e davam mundos e fundos pelo livro, fiquei muito entusiasmada, aceitei o contrato e foi tudo muito rápido.
Com isto aprendi muito, aquilo é um negócio autêntico e eles têm milhares de autores. Os autores pagam parte dos livros, somos obrigados em contrato a comprar um número de livros por isso, só com essa compra, eles pagam o resto da publicação. Esta editora não tem livro em estante, vende muito pela internet ou nas lojas deles, existe em todo o mercado, mas online, nas lojas não. Os novos autores com pouca experiência acabam por ser levados em erro, temos sempre aquele sonho, é um prazer ver um livro publicado, é um orgulho. Foi assim a minha experiência, espero que se repita, mas para a próxima já tenho outra bagagem, já vou tentar encaminhar noutro sentido.
Após o lançamento do “Ciclone” foi à Feira do Livro de Lisboa como autora. Como foi essa experiência?
Fui duas vezes, em 2017 e 2018. A primeira vez foi uma experiência incrível. Estava com mais um senhor e para quem passava por lá nós eramos autores desconhecidos, não havia assim muitas pessoas a virem pedir autógrafos como é obvio, um ou outro ficava curioso porque tínhamos o livro lá e as pessoas ficavam com curiosidade. Mas foi uma experiência gira, senti-me orgulhosa, é uma memória que fica.
Fiquei mais surpreendida com o orgulho que senti da minha família, dos meus amigos, até das mães das minhas amigas por ter escrito o livro. Fico orgulhosa de ter conseguido este feito, escrever o “Ciclone” foi um sonho tornado realidade.
O que pode contar sobre o “Ciclone”?
É um romance que vem pelo tempo. Começa com três irmãs, todas diferentes umas das outras, a história delas é muito idealizada pelo que era a família da minha avó, mas é diferente claro, algumas situações que descrevo aconteceram comigo ou recordo a minha avó contar, ou são histórias de histórias, ou são completamente inventadas.
Mas é a história da relação dessas irmãs e como elas cresceram e as vivências. Vão havendo outras histórias que se entrelaçam na vida daquelas miúdas que de pequeninas se tornam mulheres. O desfecho calha no tal ciclone de 1941, a história do fenómeno em si não é muito aprofundada, é mais para fazer o cenário do final da história. Penso que seja uma história que puxa valores como o amor, o respeito e até como as pessoas mudam.
Há muitas leitoras que dizem que se identificam, é uma história passada aqui na nossa zona e as pessoas da minha geração que leram o livro dizem o mesmo, que se identificam com as coisas descritas e com certos pormenores, está muito relacionado também com as vivências aqui na nossa margem.
O Montijo vem representado?
Sim, sim. Não como cidade, não digo que é o Montijo ou a Atalaia, mas quem é de cá identifica a zona.
A minha imagem para a zona mais rural é a Atalaia, aquelas características dos Círios e dos bailes que explico são tudo coisas que os nossos pais faziam quando eram mais jovens, a minha ideia vem tudo das vivências e das histórias que ia ouvindo. Quem é de cá consegue identificar-se ou reconhecer este nosso tipo de vivência.
Porquê o título “Ciclone”?
O final culmina no ciclone e a própria história, o enredo, é um turbilhão de emoções, vivências e mudanças de vida, desde o início ao fim é um ciclone.
O que foi mais difícil ao escrever o livro?
Não achei nada difícil. Fiz muita pesquisa e gostei. Idealizo, mas depois tenho dúvidas, é trabalhoso, mas difícil não. Até o escrever em si, vai saindo, nos dias em que não estava para aí virada também não escrevia, não tinha aquela obrigação de escrever todos os dias. É trabalhoso, mas estava empolgada e gostava. Ainda hoje há certas partes que leio e tenho vontade de chorar, sou muito emotiva.
Quem são os seus escritores de eleição?
Em Portugal, José Rodrigues dos Santos é o que mais gosto, adorei um livro que é “A Ilha das Trevas”, tenho lido muitos livros dele e gosto muito. Gosto de Dan Brown, Laura Esquivel e tantos outros.
Escolho os livros não é bem pelos autores, normalmente leio o resumo e vejo se a história me atrai ou não, até tenho lido livros de autores que nem conheço. Gosto de romances, aventura, ficção e fantasia não gosto. Gosto de suspense e crime também.
Quais são as perspetivas para o futuro?
Continuar a escrever. Este ano tinha sido uma aposta minha terminar o segundo livro, mas infelizmente não tem sido fácil, não me tenho conseguido dedicar como queria. Com este livro é o contrário, ainda não tenho o final, tenho alguma coisa de uma das personagens, mas ainda não tenho a certeza. É uma história completamente diferente, numa época diferente e num ambiente que não é o Montijo, mas também é uma zona que gosto, é mais ligado ao mar.
Depois tenho várias ideias na manga. Com a sensibilização ambiental tenho feito várias coisas para miúdos e tenho uma história escrita, é engraçada e educativa. Também gostava muito de escrever livros infantis só que não tenho o tempo para me dedicar.
Tenho outras histórias também que um dia gostava de pôr no papel, mas para já quero acabar este e não sei se, entretanto, não pego na história infantil.
Que conselho deixa a quem gostava de se aventurar na escrita?
Toda a gente que tenha gosto por escrever deve escrever realmente, não deve ser com aquele objetivo de ser escritor, mas por gosto, assim a obra sai com muito mais interesse. A pessoa não o deve fazer porque tem de ser, mas porque gosta realmente, depois há sempre uma estrelinha que encaminha. Se tiver de ser, será com certeza.