Francisco Santos: “Fiz desta terra [Montijo] a minha vida”

Francisco Santos, atual reitor da Universidade Sénior do Montijo, carrega, em si , 85 anos de paixão pelo ensino e pela política. Natural de Portimão , mas vivendo no Montijo há largos anos, conta ao Montijo On City o que o atrai mais no município e não esconde o seu amor  pelos que o rodeiam.

O professor nasceu em Portimão e viveu em Portimão até vir estudar engenharia mecânica para Lisboa, certo?

Assim teve de ser. Nasci em Portimão em 1936, sendo o oitavo filho de uma excelente família. Fui o único filho que continuou os estudos após a quarta classe. Estudei em Silves, terminei o curso industrial de mecânica de 5 anos e, aos 16 anos, fui para Lisboa com o objetivo de prosseguir os estudos. Eu tenho dois cursos: sou engenheiro técnico de mecânica e sou licenciado em administração e gestão escolar.

Todo o meu ensino foi feito pela capital e o primeiro contacto com o Montijo deu-se quando comecei cá a trabalhar.

Que idade tinha quando se mudou de Portimão para Lisboa?

Quando me mudei para Lisboa, estava próximo dos 17 anos. Costumo dizer que não é fácil para um jovem, que nunca tinha saído do Algarve, vir sozinho para a grande Lisboa, capital do país. No entanto, foi bem mais fácil do que esperava. Encontrei excelentes amigos e criei fortes amizades que me sustentaram e foram de extrema importância na minha vida escolar.

O que o atrai mais no Montijo?

O Montijo é uma cidade de “portas abertas” para quem a visita ou para quem pretenda nela viver. Este foi o meu caso, mas, para mim, o que me atrai mais na cidade são as pessoas que cá vivem e que tornam este lugar tão especial. O que me atrai mais é a maneira fácil com que criei amizades e a forma como me permitem trabalhar em equipa.

“Todos os dias aprendo imenso com os montijenses e é isso que me atrai mais nesta minha nova terra.”

Gosto das pessoas, gosto de viver cá no Montijo e gosto da cidade enquanto ela mesmo. Esta terra é hospitaleira, sabe muito bem receber as pessoas e participar na vida das pessoas. Foi algo que me apaixonou completamente.

Se tivesse alguma coisa para mudar no Montijo, o que seria?

O Montijo tem mudado muito nos últimos anos. Em 52 anos vi a cidade a alterar grandemente, mas é natural que todos queiramos sempre fazer mais e melhor. Eu costumo dizer que houve grandes alterações, mas ainda há tanto por fazer. Mas isto é no Montijo como em qualquer outro sítio. No entanto, se tivesse de alterar algo, seria em dois aspetos: um deles era para que todos os munícipes tivessem um médico de família e a outra situação era o problema das casas com rendimento adequado ao rendimento das pessoas.

Gostava que o aluguer das casas fosse adequado ao vencimento das pessoas, ou seja, que existissem casas com rendas sociais. Fico contente por sentir que estamos a trabalhar para tal. Gostava que houvesse a possibilidade de haver também mais centros de saúde. Quanto às casas para pessoas com rendimentos mais baixos, é uma oportunidade de dar a possibilidade aos jovens de alugar ou adquirir imóveis por valores que estejam consonantes com a vida atual.

Sempre esteve ligada à parte do ensino, mas era pensamento seu vir a fazer profissão na área educativa?

Pensei sempre em vir a iniciar a minha profissão de sonho, sempre pensei em vir a ser professor. Considero que é aquela que mais se adapta à minha maneira de estar e viver a vida. Já na época em que estudava em Silves, gostava de aprender, estudar e ajudar os meus colegas com a matéria.

No entanto, o meu início na carreira foi mais cedo do que esperava. Eu tinha pensado em terminar o curso primeiro, mas fui desafiado a dar aulas ainda enquanto estudava. Eu tinha aulas da parte da tarde apenas, era o meu último ano de curso, e lecionava à noite. Foram 37 anos e 7 meses de trabalho na área que mais me encanta. 37 anos nos quais muito ensinei, mas também muito aprendi e é isso que me faz gostar desta profissão.

Que momento o marcou mais enquanto professor?

Ao longo de 37 anos ligado ao ensino, foram vários os momentos que marcaram a minha vida. No entanto, é sempre importante enumerar alguns que têm um lugar especial no meu coração. Um deles foi a minha primeira aula no 3º ano do curso de Mecânica, com 25 alunos presentes. Outro momento impactante foi a primeira vez em que me nomearam Presidente do Conselho Diretivo e a forma como desempenhei esse cargo por 20 anos consecutivos.

Lembro-me de participar num grupo de trabalho nomeado pelo Ministério de Educação que ocorreu no Baixo Alentejo, com o objetivo de criar uma área de formação para jovens com ou sem sucesso escolar. Este também foi um momento impactante na minha carreira enquanto professor.

Mas uma certeza eu tenho. O papel de um professor é importante, mas sem alunos não há aulas. Por isso, os alunos têm um papel tão importante na vida do ensino, da escola e dos professores.

Que papel tem o ensino na sua vida atualmente?

O ensino teve, tem e sempre terá um papel importante na minha vida. Continuarei a investir em tal, enquanto for possível. Tudo o que tenho feito, desde o momento em que deixei o meu papel no ensino pelo limite de idade, só foi possível realizar pelo muito que aprendi durante mais de 37 anos como professor.

Eu gosto muito de aprender e de ouvir. Sempre que havia ações de formação, ia a todas. Aprendo sempre, até mesmo aqui na Universidade Sénior. Aqui aprendo muito mais do que dou e sei que há uma coisa que gostaria de manter por mais uns anos: o meu querer saber.

Como é que a política surgiu na sua vida?

Eu mentiria se dissesse que ser político alguma vez esteve no meu horizonte, não esteve. Desde que vim para o Montijo que sempre me tentei enquadrar a 100% na terra.

“A minha preocupação foi sempre conhecer o máximo possível da cidade e fui, aos poucos e poucos, sentindo-me cada vez mais montijense.”

Tinha alguns amigos que tinham essa ligação à política e eu fui aprendendo algumas coisas com eles. Como disse, criei fortes amizades que permanecem até aos dias de hoje e houve um momento no meu caminhar em que um grande e velho amigo meu me convidou para fazer parte da listo do Partido Socialista, enquanto candidato à Assembleia Municipal do Montijo. Foi uma excelente experiência, de tal forma que, anos depois, já como militante do partido, fui candidato à Junta de Freguesia do Montijo e assumi essa presidência durante quatro mandatos, ou seja, 16 anos da minha vida.

Por fim, fui ainda candidato a vereador da Câmara Municipal do Montijo, com o cargo de Vice-Presidente e se há algo que posso salientar é que todo este período foi um marco importante para a minha vida.

O que significa para si ser reitor da Universidade Sénior?

Foi uma honra quando recebi o convite do atual Presidente da Câmara, engenheiro Nuno Canta, para assumir o cargo de reitor da Universidade Sénior, com mais dois elementos. Não o aceitei com o objetivo de querer uma ocupação, mas esta é verdadeiramente a minha paixão. A minha paixão está com tudo o que esteja ligado ao ensino. Este foi um novo renascimento para mim porque ao longo dos 15 anos após me ausentar da escola, falava sobre outras áreas que não a educação. Ser reitor deu-me essa possibilidade.

Por isso, a minha entrada para a equipa reitoral da Universidade Sénior baseia-se em duas linhas principais. Primeiramente, retornar à educação e voltar a ter a educação presente no meu dia a dia. Em segundo lugar, puder contactar com pessoas diferentes e que em muito me faziam lembrar da minha vida educativa. Considero-me tão feliz por ter aceite este desafio, não só por retornar aos tempos de professor, mas porque me permite também reconhecer o trabalho que a reitoria, que todos os professores, alunos e funcionários desempenham para manter o funcionamento e bem estar da Universidade Sénior.

“No dia em que sair, vou-me considerar muito enriquecido e a única maneira de conseguir agradecer vai ser através de um “obrigado” a quem me desafiou e a quem me acompanhou aqui porque sempre defendi uma aprendizagem constante.”

Quando chegar ao fim, considero-me um felizardo por ter sido convidado para pertencer à Universidade Sénior e por tudo o que aprendi com os professores e com os alunos. Na sua maioria, tento sempre assistir às aulas e às práticas, com artes decorativas e artes com agulhas, aprendo sempre muito. Aprende-se sempre e é por este motivo que eu, mais a minha equipa da reitoria, sentimos o nosso trabalho facilitado.

Que planos tem para o seu futuro?

Com 85 anos, sei que tenho de pensar bastante sobre o futuro. Sempre me disseram o quão importante é assumir um lugar e trabalhar em prol dessa função, mas também sei que mais importante ainda é saber sair e quando o fazer. Assim, no momento oportuno saberei o que fazer. Em toda a minha vida coloquei sempre em primeiro lugar o serviço e nunca a minha pessoa e estou certo de que continuarei a fazê-lo.

Gosto de pensar naquilo que ainda posso oferecer, saber quando me retirar e quando ficar, ser cuidadoso com aquilo que aceito fazer. Esta é a minha maneira de ser.

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