Luís Rouxinol: “(…) muitas das pessoas que criticam as corridas nunca foram assistir e não sabem como o espetáculo é envolvente”

Uma conversa sincera e direta com Luís Rouxinol que conta como a sua vida está inteiramente relacionada com a tauromaquia.

Na segunda parte da entrevista, Luís Rouxinol explica o orgulho que sente no filho mais velho, herdeiro da sua paixão pelas corridas e que já começou a vingar no mundo da tauromaquia. O cavaleiro também desabafou com o Montijo On City sobre os “ataques injustos” que a atividade tauromáquica tem sofrido e como podem por fim a uma profissão da qual dependem “bastantes famílias”.

O seu filho, Luís Rouxinol Júnior, já lhe segue as pegadas. Acompanhou sempre o pai nesta vida e, apesar do seu primeiro desejo ter sido tornar-se futebolista, aos 11 anos afastou essa ideia.

É verdade! Ele ainda andou nas escolinhas do Vitória e jogava bem. Sempre teve o gosto pelos cavalos, mas nunca pensei que ganhasse este vício de tourear. Lembro-me de me ter pedido para tourear uma vaca e aquilo até não correu muito bem porque ele ia caindo logo. Embrulhou-se com a vaca e com o cavalo e ia acontecendo um acidente. Deve ter sido o suficiente para ganhar o bicinho. Mas nunca o influenciei em nada. Como tudo na vida, as pessoas têm de gostar do que fazem, não pode ser incutido por ninguém. E ele está num bom caminho. Penso que tem as qualidades para vir a ser um grande toureiro.

Qual é a diferença entre tourear e ver o seu filho a fazê-lo?

Eu sofro mais quando ele vai tourear do que com as minhas corridas. Tenho colegas que se sentem mesmo mal, não chego a esse ponto, mas fico mais nervoso. O meu filho também é mais descontraído, mas custa sempre um bocadinho porque sei que ele tem menos experiência. Tenho de me habituar. Ele acompanha-me sempre. Quando não toureia, vem comigo na mesma e vice versa. Este ano, calhou termos várias corridas no mesmo dia, então eu tenho de ir para um lado e ele para o outro.

O toureiro com o filho ao colo_DR

É muito exigente com ele?

Às vezes sou um bocadinho de mais. Nos treinos grito um bocado, mas é para o bem dele. E os gritos que lhe tenho dado têm feito efeito dentro da praça. Ele lembra-se das coisas que lhe digo.

Que conselhos lhe dá?

Digo-lhe sempre para não se precipitar antes das corridas. Eu já tive a idade dele e aquela vontade de querer “comer” o mundo. Queria fazer as coisas rápido e bem e isso é impossível. Digo-lhe sempre para ter cabeça e tentar ler as características do touro. Se conseguir fazer isso é meio caminho andado para o triunfo. Ele é trabalhador e está num bom caminho.

Luís Rouxinol Júnior junto do seu pai_DR

O que é que o fascina na tauromaquia?

É uma sensação que não tem explicação. Ver o touro entrar na praça e tentarmos proporcionar um bom espetáculo ao público. Quando as coisas estão a correr bem, sentimos o público a entregar-se e a aplaudir-nos de pé. Isso é muito gratificante porque os pequenos 15 minutos que passamos na praça são o resultado do que treinamos ao longo de semanas e semanas. O nosso trabalho fica logo reconhecido.

Quem são as suas referências profissionais?

Nos meus tempos de miúdo havia toureiros que admirava muito. O José Mestre Baptista e o David Ribeiro Telles foram cavaleiros que eu sempre admirei. Grandes figuras daquela altura.

Tenta enfrentar os desafios do dia-a-dia como enfrenta os touros?

Sim, a vida tem muitos touros difíceis. Agora com esta situação da pandemia tem sido complicado.

Com o confinamento teve de deixar de dar espetáculos. Como foi estar este tempo todo sem fazer o que gosta?

Não foi fácil, não só por não fazer o que gosto, mas por ser uma profissão que tem muitas despesas. Tenho 22 cavalos em casa a comer todos os dias e dois empregados para me ajudar. Ao final do mês é uma despesa enorme e estar naquela indecisão de não saber quando tenho o próximo espetáculo ou se vou mesmo chegar a ter é frustrante! Chegamos a um certo ponto em que não sabemos o que fazer, mas agora já se está tudo a compor.

“Têm pena dos animais, mas existem milhares de pessoas dependentes da tauromaquia, não são só os cavaleiros”

Como é que imagina a tauromaquia em Portugal daqui a dez anos?

Eu costumo dizer «O futuro a Deus pertence». Mas a tauromaquia e o mundo rural em si, como a caça, têm sofrido muitos ataques injustos. Eu penso que quem faz esses ataques deveria preocupar-se mais com outras coisas. Os idosos, por exemplo. E ninguém se preocupa com isso. Têm pena dos animais, mas existem milhares de pessoas dependentes da tauromaquia, não são só os cavaleiros. Em Portugal, existem bastantes famílias a sobreviver devido a esta profissão. Os ataques que existem hoje são impensáveis. Estamos num país democrático e temos de respeitar as ideias de cada um, existem tantas coisas de que não gosto e tenho de respeitar. O facto de irem fazer manifestações para as portas da praça e ofenderem todos os artistas que estão ali presentes, será que isso é democracia?

Para si, a tauromaquia é uma arte?

Claro que sim. Tanto que está inserida no setor da cultura.

A conexão com os cavalos é muito importante para o cavaleiro_DR

Já foi a algum espetáculo de grupos de toureiros cómicos?

Sim, já. É também uma arte. Não é qualquer um que é capaz de ir a uma arena e fazer divertir as pessoas. Infelizmente, é algo que está a desaparecer. Havia muito na altura do Carnaval e os miúdos adoravam. Era também assim que nasciam os aficionados. E digo-lhe uma coisa, muitas das pessoas que criticam as corridas nunca foram assistir e não sabem como o espetáculo é envolvente. Ainda ontem vi uma carta que está a ser divulgada na internet de alguém que assistiu a uma corrida de touros e ficou com uma imagem completamente diferente. Disse que adorou e não tinha nada a ver com a ideia que faziam passar.

O que é que muda se alguém for assistir?

É a energia do espetáculo. Todos se respeitam, ao contrário de outros espetáculos, como o futebol em que o público se exalta e há troca de insultos. Os forcados têm valores, como a amizade, a união. Têm muito respeito uns pelos outros e isso passa para o público. Para criticarmos alguma coisa temos de ter a noção do que estamos a falar.

O que gosta de fazer nos tempos livres? Tem outra paixão, para além de tourear?

Eu vivo no campo, tenho animais. Gosto muito de caça, é um hobbie que me deixa descontraído, limpa-me a cabeça dos problemas do trabalho. Porque não é só ir à caça, é estar com os amigos a conviver. É, sem dúvida, algo que me faz bem. Também gosto muito de ir ver jogos de futebol, sou do Benfica. Mas, no geral, gosto de tudo o que esteja ligado ao campo.

A caça é um dos hobbies de Luís Rouxinol_DR

O seu pai deve sentir um enorme orgulho no que o filho se tornou.

Era o sonho dele. Penso que ele tem muito orgulho na minha carreira e tudo o que sou hoje deve-se a ele. Tenho de lhe agradecer por todos os sacrifícios que ele fez porque as coisas não foram fáceis. Ele era um simples agricultor e os cavaleiros vinham todos de dinastias. E eu singrei numa família que não tinha nenhumas tradições taurinas. É muito mais difícil.

O que ainda espera alcançar com a sua profissão?

Não espero andar cá muitos mais anos. Devo ter mais três ou quatro de carreira e depois gostava de me retirar num bom momento. Não gostava de me andar a arrastar como, por vezes, acontece com alguns colegas . Quero sair mesmo em alta. Ainda para mais agora já tenho o meu substituto. Com certeza que me vai proporcionar coisas muito boas. Quando deixar de tourear não vai ser algo premeditado. Vou fazer uma corrida e, se me correr mesmo bem, vou dizer «Foi a última corrida que eu fiz».

“(…) vou estar sempre ligado aos cavalos até morrer”

O seu lema é «Viver sem tourear não é viver!». O que vai fazer quando não tiver uma agenda repleta de corridas?

Vou andar sempre a acompanhar o meu filho, claro. Vou ter os treinos todos os dias. Vou estar a tourear em casa, a única diferença é que não existe o contacto com o público. Mas, vou estar sempre ligado aos cavalos até morrer.

Se não fosse cavaleiro tauromáquico o que seria?

Cavaleiro tauromáquico (risos). Não havia hipótese.

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